terça-feira, 30 de dezembro de 2014

SUSPEITAS (ou RUAN, HERÓI OU BANDIDO)

 Suspeitas são flashes provindos do “inconsciente coletivo”, segundo Jung, que quase sempre, colidem com seu eco na realidade individual. Suspeita-se, e não muito tempo mais tarde, confirma-se. Um princípio religioso e outro judicial apressam-se em demolir a teoria acima. O primeiro diz que não se deve julgar e o segundo que todo indivíduo é inocente até que se prove o contrário.
Acostumada estava eu a seguir os dois preceitos, até que uma circunstância assustadora me empurrou para o caminho do pecado e dos fora da lei.
O rapaz trazia sempre um ar destemido, um ar de herói. Estendia-se correto, esguio, ostentando um label de “confiem em mim”. Não sei por que, lá pelas tantas, apareceram as suspeitas. Eu tentava pinçar o evangelho, a justiça, mas elas continuavam lá, insistindo, caluniando.
O tempo passou. Não muito longo. Os fatos se desenrolaram. Não muitos. E a verdade confirmou minhas suspeitas. Não era herói coisa nenhuma. Meu ego inflou-se, acertara em cheio. Porém, o susto e a desilusão eram maiores que o sentido de mérito.
Agora, conhecendo alguém, lisonjeada pelo sucesso e habituada ao vício, lanço mão do inconsciente de Jung, mas, por via das dúvidas, evoco o preceito religioso e o judicial.

Evito um veredito e dou ao “culpado” o benefício da esperança. A esperança de que suas virtudes provem o contrário.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

O inacreditável futebol clube

O rei foi deposto. Os vassalos assumiram a festa. E, agora, é preciso tirar a espada da pedra. Um reino sem rei, não tem lei.
O Brasil, um reino que reinava como um rei segurando seu cetro. Apoiando-se suavemente na esfera no topo do objeto em questão. O cetro que apresenta o rei como “sua majestade”. Sem cetro, nada de imponência. Sem a esfera ornamental no topo do corpo cilíndrico, não há estabilidade, nem monarquia.
O Brasil reinava com a mão sobre a esfera. Então, o rei sumiu. Como em “O príncipe e o Mendigo”, deve ter escapulido para trocar de ares. Na hora da festa, ninguém soube ninguém viu.

O reino perdeu a mágica. A espada permanece na pedra, fincada, esperando um encantamento. Esperando um rei encantado, que talvez, não mais se apoie na esfera do cetro. Nem sobre a espada. E, certamente, que não precise se apoiar, mas que apoie seu povo.

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

O nascimento, um menino, a mãe.

Doce de mãe é calda escura no fogão. Cheiro de mãe é doce de calda. Mãe é um doce caramelado estendido na mesa de domingo.

Domingos são mães estendidas para se relaxar, confiar. Mães são domingos, no meio da semana.

Presença de mãe é sempre, mesmo quando ela não está, mesmo quando ela não é, mesmo quando não se quer.

Calda de mãe é cheiro impregnado no ar.

Mãe faz o pai, mãe faz que faz. Faz doce, faz paz, faz a mesa e desfaz.

Nada preocupa quando mãe está, quando mãe é.


Mãos são mães que asseguram o andar, o fazer, o ninar. Mães são mãos que jamais deixam pra lá.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Seguir o padrão

Entra, sai, bom dia, boa tarde. Pelo sim pelo não, nada vou dizer.

Negócios à parte, esta é a minha parte. Sim, o que é melhor para mim. Quem se importa?

Estou nisso a séculos, ai de mim! Digo não sempre, e só dizem não para mim.

Só um instante, hum… acho que não, acho que já ouvi uns “sim”.

Pensando bem, já fui tratado com surpresas. A surpresa de não valer “meu quinhão primeiro”.

Um menino, de cinco, já me pediu desculpas. Alguém já me disse ter descansado bastante e que eu podia sentar. Morri!
Já pedi informações e fui prontamente, atendido, com um sorriso. Quis falar de mim, uma vez, me ouviram sem críticas.
“On second thoughts”, como dizem os ingleses, já é tempo demais jogando segundo as regras do jogo, talvez devesse inovar.
“Go crazy” para ver no que dá.
Gritarei pela diferença, pela deferência. Não mais entrar e sair, acho que vou ficar.

Acho que perguntarei “como vai?” e esperarei a resposta.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Síndrome de Estocolmo

Ela foi sequestrada. Desligada da ambientação amada. Calada, ameaçada e foi pouco a pouco tecendo admiração.
Mudou de lado, quis ficar do lado do sequestrador, um deus que podia lhe tirar tudo ou tudo conceder. Escolheu não ser machucada. Confusão por confusão, pinçou a aventura e não a rotina.
Olhara bem nos olhos de quem lhe oferecia o pão, na cela, com uma das mãos e com a outra lhe atava a mordaça. Jamais esqueceria os olhos, jurou, mas esqueceu.
Um dia, aparentemente, novos olhos a seguiram. Fingiam, tramavam e capturavam. Ela cedeu, aprisionou-se, concedeu.   Noutro dia, os reconheceu, eram aqueles mesmos olhos, torturadores, sequestradores, e ela emudeceu.
Alguma coisa estranha se passava em suas entranhas, uma náusea, um medo e ao mesmo uma vontade de ficar, de comer à mesa, de dividir o pão.
Ia definhando, já não queria comer, já não queria ficar, mas, estranhamente, não conseguia correr.
Atada, amordaçada, vendada longe de toda afeição de verdade, só, com um carinho pré-moldado, fictício comprado em liquidação, mas não conseguia correr.
Quando dormia tinha um sonho: uma porta escancarada, uma longa estrada. Quando acordava, cansada e com a circulação agitada, percebia, no sonho, ela conseguia!!!


quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Crer para ver

Tecnologia de ponta! Que nada! Cadê a ponta que não se vê?
Assim sendo, ficamos acertados, ver para crer não faz mais sentido. Crer para ver é a regra do jogo. Sem ponta, sem desenrolar e tudo está lá, para se ver, ter e tocar. Na rapidez do “penso, logo existo”.
Sem incertezas, sem dúvidas, só mouse-pad e touch screen . Tudo está ao alcance de todos, onde quer que estejam. Alguém pensa, crê e é.
Hoje em dia, o mar não está para os cínicos. Quem lança a rede na fé, pesca o céu da metáfora que está à mão dos olhos que não veem.
O Coringa, o AS no jogo de existir é fiar-se. Só existe quem se fia no coração a bater e no cérebro a pensar. Só escapa quem se fia nas pernas a correr. Só tem aquilo que quer aquele que crê antes do acontecer.
De créditos em créditos é que a vida se enche de rumo e beleza, mas, jamais, de blefes em blefes.



terça-feira, 9 de dezembro de 2014

“Vós sois deuses”.

O anzol bem leve balançava no ar, por segundos, sem conseguir a pesca. O homem insistia. E mais uma vez, o balé estranho do anzol encantava quem assistia.
Mais uma tentativa, e lá se foi o anzol, parou quietinho na ponta da toalha e fisgou o objeto, direitinho.
 O homem resgatou a toalha do telhado da sacada do prédio vizinho.  Radiante e sorridente, sob os aplausos silenciosos de outros homens, que em outras sacadas, ensinavam pipas a voar.
Sua pesca estranha era a vitória do engenho sobre o desafio. Pensou, organizou e concretizou, como um Deus a criar. Os outros homens, que rendiam suas homenagens ao pescador insólito, também eram especiais. Faziam voar e comandavam o bailado das pipas, simplesmente divinos.

E então, o homem voltou para a sala, com seu peixe e seu segredo: “Vós sois deuses”.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Publique-se

Multiplique-se o bom ato, o bom hábito, o bonito.
Certifique-se com atestado, o consenso, o de bom senso, a sensibilidade.
Duplique-se o esforço, a elegância, a sinceridade, a fraternidade, a sonoridade do incentivo.
Silencie-se a crítica, a ferida, a perfídia, a intriga.
Justifique-se, sim, por que não? Quando da palavra torta, da incoerência, da negligência, do descrédito.
A alforria, a alegria, a vocação, a homenagem, o “vá com as bênçãos”...

Publique-se!!!!

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Não devo lembrar

Da poça que fez questão de fazer maremoto sobre mim. Do carro que não encontrou outro espaço para passar. Do dia que decidiu ser dia de tristeza. Da confusão, da escuridão, não, não devo lembrar.
Esquecer como, mas devo, de dias de humilhação. Da hesitação que rege com a batuta em riste a minha ação. Da imensidão que insiste em ser nada dentro de mim.
Olvidar eu devo, a falta de ouvidos para abarcar a intuição, o caminho. O dever não cumprido. O cumprimento que não veio. O abraço retido e o sorriso que morreu a caminho. Do caminho amargurado que bate na porta da casa para fazer via expressa.

 Não devo lembrar, mas lembro de tempos inexistentes como passados e futuro, este último que nem acontece como se deseja e instantaneamente vira passado. Lembro-me disso tudo, mas me esqueço de hoje, do agora, do tempo de fazer por onde não precisar da lista de “não devo lembrar”.

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Bom dia

- Por onde começar?
Bom dia! E lá vamos nós outra vez.
- Para onde? Para o trabalho.
- Por quê? É, este “a esmo tem que acabar”.
- Por certo! Mas como?
Boa pergunta, tem resposta, tem. Não é mais um dia, é mais um começo. Não é a revelia, é por decisão, é com certeza.
- Onde está escrito isto?
No início do filme, que se diz já ter visto. Bem lá na abertura. Um belo roteiro, com princípio, meio e fim. O dilema é que o fim fica no caminho, trancando o peito, engolindo a história. Desse jeito o ritmo da ação se regula pelo medo do “the end”.
Por certo a melhor parte da película é o início e o desenrolar do enredo. O fim está para ser escrito. É bom começar do começo e recomeçar sempre.
Propenso, decidido, capaz, sem medo. Quer um final feliz?
Bom dia!



terça-feira, 25 de novembro de 2014

Dias melhores virão

“Não haverá, não”. Pensava meu coração. Enquanto a vida corria, eu me parava.
Não sentir nada era o meu bordão. Não ser de um grupo, não pertencer, eu queria era sumir num rabo de foguete.
Mas, ao contrário fui ficando. Enquanto eu ficava, a vida corria. Ela era sempre a mesma, e eu, em ebulição. Aceitação zero, tentava somar, mas tudo diminuía.
Fechava os olhos naquela desolação e fingindo e ofegando, fui pegando o que a vida oferecia.
Um dia, me dei conta de que havia muito para dar conta, e sim, eu tinha o que fazer.

Fui dando conta de tudo, um dia depois do outro, e certo dia, vi surgir como um label, embrulhando minha noite para ser entregue na manhã seguinte: “dias melhores virão”.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Pistas de si

O lápis caiu. Rolou para o canto onde ele não alcançava. O laboratorialista desistiu de tentar se enfiar entre a escrivaninha e o frigobar vermelho. Sem canetas que escrevessem, sem rede, precisava, desesperadamente, do instrumento de grafite para anotar a fórmula que comporia o relatório cobrado para ontem.
Sua sala de trabalho era seu esconderijo. Desaparecido no laboratório dava conta de toda demanda, até não darem conta dele. Pensar, anotar, memorizar era sua rotina, olhar, nunca. Ver em volta, nem que fosse uma pequena espiada naquela maravilha de árvore que se espremia nas vidraças só para lhe chamar a atenção, não, certamente, não fazia parte de sua atuação.
Nesse dia fatídico, a chuva insistiria em mudar toda história do patologista. Batucava de mansinho na janela, fraquinha, a princípio, decidida depois.
Nunca olhara, mas, agora olhava extasiado, sem movimento, sem fala. A chuva inundou seus pensamentos. Continuou escorrendo pelas vidraças, pelas folhas, parecia que lavava o dentro dele. A fórmula se esquivou e se encolheu num canto, feito o lápis. As palavras, seus bordões empilhados, começaram a escorrer- lhe peito afora: desconfiar, bem escondido, tudo vai mal, jamais, não eu, não faz sentido, não é lógico.
Ele amoleceu feito água.  A partir daquele instante, quis deixar pistas de si. Quis ter face book, twitter, inventar versos e músicas, quis ser roqueiro. Os olhos rasos d’água continuavam embevecidos com o fenômeno divino.
As batidas na porta fizeram voltar-lhe o raciocínio, a fórmula, o relatório, o tino. Por um breve momento, compreendeu ser cúmplice e vítima de um assassinato.
Atendeu a porta, entregou o documento incompleto e voltou a se enfiar entre o frigobar e a escrivaninha, vermelho.



terça-feira, 18 de novembro de 2014

Leões e cordeiros

Não apareceram para o salvamento. Insistiram na vingança. Mas dia virá em que de muito custar fazer doer, se renderão.
Cheios de marcas se alijarão das correntes, não tão mansos, talvez mais mancos, mas prontos para depor as armas.
Últimas palavras serão ditas e pródigos filhos serão bem-vindos. Haverá silêncio e esquecimentos e ventos que afastarão as ações custosas e tristes.
Haverá prantos, abraços e o salvamento será a rendição de todos, de qualquer parte.
O que lhes custar valerá. O que lhes derem bastará. Os acordos que fizerem bastarão.
E se deitarão lado a lado.


quinta-feira, 13 de novembro de 2014

PECADO MORTAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA

Não tem apelação nem em Brasília. Não há a quem recorrer. É condenação ao inferno no sétimo dia. Arrisque pra ver!
Passe direto, de cara emburrada, por uma criança que te cumprimente com seus olhinhos sorridentes. Duvide, quando o moço, na bilheteria do cine te diz: “bom filme”.
Não aceite uma bomba de chocolate da Copenhague. Deixe sem um sim o convite de aniversário do amigo que você não vê há tempos.
Permaneça no sofá, quando a melhor banda, aquela que você adora, está em sua cidade com entrada franca.
Francamente! Você já deve ter percebido a jogada. É pecado mortal de última instância não viver, não conviver. É pecado mortal não ser feliz. Deve ter percebido, também, que ir ao inferno no sétimo dia não é morrer e conhecer o diabo, mas, é não ter alegria na alma.
Vou deixar bem claro que não estou aqui a serviço de uma doutrina religiosa, mas, a serviço do bem estar de qualquer coração. Olhe bem a sua volta, não vez por outra, mas sempre e veja o que o dia te oferece. Não fique dentro de si, com medo de “lá fora”.

Dê um pulinho na vida, nos outros, porque aceitar-se deprimido, contido, espremido é pecado mortal de última instância. 

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Todos

Têm perdão e segunda chance e o condão de decidir.
Têm irritação, malquerença e solidão.
Todos têm deveres de afeto e saúde.
Todos têm direitos de dizer sim, de cooperar, de sorrir, de elogiar, de conceder e de arrefecer.
Todos são grandes por fora e pequenos por dentro, e quando pequenos por fora, também são liliputianos por dentro.
 Todos são santos e insanos ao mesmo tampo e levam tempo pra ficar num só perfil.
Todos são todos e individuais. Estando no mesmo barco, fazendo água e se ajudando com latinhas.
Todos vão ao sabor da maré, até certo ponto, e tomam pulso e direção de supetão.

No fim, somos todos irmãos.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

“Não tem de que”.

Não agradecidos estamos todos nós, pelo sol, pela lua, pelo ar e até mesmo pelo imenso mar.
- Não, não basta! Dizemos nós. Então precisamos de mais o que?
Cãezinhos, gatinhos, flores, pássaros multicores? – Não basta!
Um pai, uma mãe, dados, emprestados, achados? – Não basta! O que?
Gentilezas jamais sonhadas? – Não basta!
Um sim de primeira, no dia da maior necessidade? – Não basta!
Um beijinho nos olhos cansados de tanto enxergar o que não se quer ver? – Não basta!
Poder respirar ar pelo nariz? Ser gente? Ter mil oportunidades de ser feliz? – Não basta!
Ter um ditado popular que corre a solta pelo mundo; “A esperança é a última que morre”? – Não, não basta!

Assim sendo, sinto muito, nunca ouviremos o criador a nos responder; - “Não tem de que”.

terça-feira, 4 de novembro de 2014

É assim que te mandam para o mundo

É assim que te mandam para o mundo, hein? Sem carta de recomendação, sem guia prático, sem perguntas, sem teste vocacional? É já podes berrar.
Mas há uma compensação, você tem algumas pistas. Acalma-te, veja na lista: não entre em fila – não fale com estranhos – não dê a outra face.
E é bom prestar atenção, também aos adendos aconselhantes: “Fica bobo aí que jacaré de abraça”. “Olho por olho, dente por dente”. “A vida lá fora num instante de devora”.
E sem mais delongas, você está dentro.
Dentro do jogo, no bojo do mundo. Você é um presente de grego e a vida é o Cavalo de Tróia. Abre-se e você sai. Engatinha, tenta os primeiros passos, caia, levanta.
E mais chavões e menos chaves. Você suplica, quer dicas, explicações. Procura na escuridão da incompreensão. E passa o tempo e o tempo passa.
 Um belo dia, você percebe que já tem um GPS. O eletrônico de dá todo serviço, agora você pode sossegar. Afinal, depois de muitas ilusões e escoriações, fica perfeitamente claro que:
“Só lobos caem em armadilhas para lobos”.
“Quem com ferro fere com ferro será ferido”.
“O acaso vai te proteger enquanto você andar distraído”.
E finalmente, “que o amor tem feito coisas que até mesmo Deus duvida”.
Enfim, é isso, é assim que você veio para o mundo, para o que der e vier.


quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Lívidos e vívidos

Abriram os olhos.
-“O relógio não despertou”. Tinham dormido demais. –“Mas, enfim, um sonho a mais não faz mal”.
Imprimiram a força habitual para se por de pé, mas o máximo que conseguiram foi arquear o tronco e ver as próprias pernas.
Estavam brancos demais, nus demais. Envergonhados, olharam em volta e aí, perceberam, estar eles, completos estranhos, num mesmo cômodo. Lívidos, nus e unidos, talvez, num mesmo pesadelo. Entretanto, sabiam estar atrasados para alguma coisa...
Perceberam: -“Era para a vida”!
Entreolharam-se, participando do mesmo pensamento. Levantaram-se da maca fria e se reuniram no centro do recinto. Pensamento com pensamento, chegaram a um consenso: estavam mortos! –“Então era assim”?
Decidiram ver no que dava, o mistério já não era mais mistério. Para onde agora? Não era mais para o trabalho, para o quarto de casa, nem para o shopping. Sabiam.
Entreolharam-se e de novo, os pensamentos consentiam, estavam nus demais e lívidos demais. Para onde quer que fossem, teriam que estar apresentáveis. Vestiram-se num piscar de olhos.
Sorriram. Aprovaram o estilo. Poderiam ir agora. Não tinham medo, nem angústia, nem complexos. Para o encontro marcado, com quem e onde quer que fosse, estavam prontos.

Lívidos, porém, Vívidos!

terça-feira, 28 de outubro de 2014

O fino da bossa

O fino da bossa é, ou seria, sabe o que? Deixar o coração vaguear, vaguear não, surfar, nas ondas do mar. Cheio de frescor e espuma. Cheio de valentia, mas mole, flexível, respeitando a lei das pranchas, pra pegar as ondas, nos dias de domingo.
O uso do termo antigo, lá no começo, é intencional e direcionado para definir como o coração deveria se sentir, naquele tempo da nova bossa. Claro que sem rojões, bandeiras, nem pressões, nem cadeias. Mas, sim, dissonante, itinerante e cheio de sucesso.
Lá vai o coração, no domingo, no parque, no cinema, na varanda. Sem pulos, nem saltos, balançando na rede lembrando-se da flor, do muito obrigado! Pode entrar! Bom filme! Isto é seu?
Bom trabalho! Sem ais, sem senões, sem cifrões.

O coração lembra-se do cardiologista a recomendar finas emoções e se sente satisfeito. “Alegria batendo no peito e o radinho tocando direito”. E lá vai ele, às três da tarde, no domingo, se sentindo o fino da bossa.

sábado, 25 de outubro de 2014

Que venha

"Porque hoje é o dia do Teatro, aí vai uma postagem fora de hora, mas espero que bem-vinda".


Que venha a Arte para fazer o homem levantar-se e ereto, usar as mãos para criar.
Que venha a Arte para projetá-lo das trevas para o amanhecer.
Somente, a Arte para fazê-lo soltar o pedaço de seu semelhante. Só a Arte para livrá-lo da fixação.
Que seja a Arte, bem vinda, para movê-lo do fundo à tona. Para lembrá-lo de voar, seu direito perene e inalienável.
Oh! Arte venha e faça o homem compreender que é divino, por excelência. É leve por natureza. É belo por criação.
Venha Arte para socorrê-lo, quando aflito e choroso dando-lhe a opção do riso.

Empunhe sua espada para sagrá-lo bem aventurado, pra sempre. E para o homem descrente, insolente, venha, mesmo que seja, somente, para desopilar- lhe o fígado. 

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Cair em si

Leva algum tempo, depois das mordidas, do soco no olho, da carta anônima, da intriga, do falso testemunho, mas chega o dia da queda.
Quedar-se, cismar, repensar, cair em si. E quanto maior a árvore maior o tombo.
Aí, bate certo medo de costelas quebradas e de crânio rachado. Certa aceitação da dor merecida. Mas que nada, é tombo no macio.
Na maciez da mente em paz, cheia de júbilo em se prestar a reparar.
Na suavidade de um coração inchado a se desvelar para ajeitar o mal feito.
Na fofura do íntimo aveludado em reconhecer poder fazer melhor.

É queda livre de uma consciência pesada que resolve um salto sem paraquedas, sem ego, sem orgulho. Livre, leve e solta. É muito bom cair em si.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

MILAGRES

Esteja no escuro, desejando, sonhando, num lugar só para você. Cheio de tudo que você admira. Céu azul claro e azul marinho. Estrelas a valer e lua a velar. Máquina de esparramar confetes. Frigideiras fritando sonhos. Vestidos de organza amarelos com bolinhas brancas em alto relevo. E mais o que? Palhaços de circo mambembe? Sim, pode ser. Filmes e pipoca. Florezinhas difíceis de pegar, em jarrinhos brancos. Livros e mais livros. Balões de gás suspensos no ar. Pessoas confidenciando sonhos.
No escuro, ao deitar, todo milagre é possível, até mesmo os assombrosos. Feche os olhos e tudo acontece e “desacontece”, aparece e desaparece. Gatos com garras afiadas, túneis intermináveis iluminados à luz de vela, caras e bocas gritando te esconjurando e nuvens negras abaixando, abaixando e devorando seu quarto. Mas, espere não tenha medo. Quando o milagre desarranja é possível desfazê-lo.
 Você pode resolver os assombros como por milagre. Com poucos raios de sol, as nuvens se dissipam. Com um belo sorriso, as caras feias se apaziguam. Indo, mais um pouco, até o fim do túnel, um lugar belo e aprazível é descoberto. Os gatos viram bichanos, ronronando por carinho.

Conjure que tudo volte ao começo e você estará lá, em paz, no seu quarto. Você e seus poderes. 

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Pessoas

Pessoas são barquinhos no meio do mar. Ás vezes, aportam cheios de presentes. Ás vezes, vazios, baldos de alegria e de tripulação. O mar de tempestade os arremessa, vez por outra, quebrados em sete paus, na praia.
Pessoas são casinhas com janela azul, vez em quando aberta, deixa-nos ver um cantinho bonito com uma decoração singela, um quadro na parede, um jarro de flores sobre a mesa.
A maioria são casinhas de janelas fechadas, mas, azuis assim mesmo.
Pessoas são mares. De tempos em tempos, bravios arrebentando ondas, em outras temporadas, mansos, calmos, de boa maré.
Pessoas são sal. São deuses. São únicas. São os queridinhos do Criador.

Digam o que disserem, pensem o que quiserem, nós somos o máximo. 

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Dia das crianças

Eles esperaram. Estancaram seu folguedo para deixar passar o carro. Bufando, mãos na cintura, chispando pelos olhos, feito oncinhas. Assim que o carro passou, atacaram-se de novo de brincadeira.
Se de brincadeira nos atacássemos. Se bufássemos de brincadeira.
Ah! Se não fosse tudo à vera e negócios de adultos.
Mas não, esquecemos as brincadeiras e jogamos “o matar ou morrer”. Esticados até o limite não soltamos a corda.
“Uma pirueta, duas piruetas, bravo, bravo”!
 Reveladas as incógnitas das crianças, equação pronta, pronta está então, a máquina do tempo que nos levará ao devido tempo. O tempo da farra de amar!!!


quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Tears for Fears

Nunca, hoje, sempre, ideias soltas, falas descabidas, desarrumação. Fatal, retornam velhos medos, rotas de fuga e somos pegos na contramão.
Voltam antigos hábitos de tremer, temer e fingir ser alguém maior que o maior e melhor que o melhor, só para não ficar de pernas bambas.
Gritar muito e fazer cara de mau, só para não derramar lágrimas. E chorando, se encolher tanto, para que não te vejam sofrer.
É um beco sem saída.
Ninguém te ama e o nada te quer.
Desarrumação pede organização. Como preconiza o Feng shui, arrume as ideias, regule o tempo pela lei de Einstein, peito para frente, queixo para cima e esqueça as fugas. Sem temores, nem tremores. Coragem, conspire para o bem!

Quanto às lágrimas, pode trocá-las pelo medo. As lágrimas lavam a alma e na faxina acolhida é o “grand finale”. “Bem-vindo a sua vida, grite deixe a dor sair, suas lágrimas no escuro, nem sempre se vê”. 

terça-feira, 7 de outubro de 2014

DEBAIXO DA MANGA


“Voilà”! E tudo é agora, nem passado, nem futuro, somente este instante.
É arriscado tomar posse desta mágica, pois não há como culpar o ontem, nem delegar responsabilidades ao futuro. Pense e é.
Portanto, todo cuidado é pouco. Tudo se projeta, num instante, bem debaixo do nariz, o que se tinha debaixo da manga. A surpresa é toda do mágico.

Pense e é. Faça-se a sua vontade. Você tem direito a três pedidos. Veja bem no que vai pensar. Não espere pelo gênio, pois o dono do evento é você.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

O dito por não dito

Enquanto, o dito por não dito fica por isso mesmo, os donos de um coração vivem um Apartheid.  Vivem em regiões baldias, onde o elogio é mudo, a admiração é cega e o coração? O coração autista.
Enquanto, o fardo não encontra cúmplice e o ferimento por dardo não recebe unguento, o coração fica agonizante sem emergência.
Enquanto, a alegria não encontra semelhante, os donos de corações vivem segregados. Mudos e inimizados, a braços com braços vazios sem abraços.
Donos de corações precisam dizer um ao outro o que faz sentido. Precisam deixar de falar demais sobre o que não faz nenhum sentido.
O que faz sentido para corações e seus donos são: ideias, ideais, sonhos e projetos, todos, itens precisando de mútuo afeto.
Estímulos, vivas, brindes, sussurros, é tudo que precisa ser dito.

 Não se pode deixar morrer na garganta o dito que faz sentido dizer.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Amigos, como não tê-los?

Na caçada do mamute, você e a lança, sozinho, não dá. É preciso outro para distrair a fera, um amigo.
Na festinha, você convidado, deslocado, é preciso alguém que goste daquela música, goste muito e ache aquela outra chata, um amigo.
Na escalada do Everest, tanto frio, tanta solidão. Na verdade, você precisa de alguém para pensar junto, esquentando a decisão, um amigo.
Quando você descobre um livro, o mais legal, e você precisa falar daquele parágrafo genial, só alguém pode dividir sua euforia, um amigo.
“Na lanterna dos afogados”, você pede “vê se não vai demorar”, só quem pode chegar lá, um amigo.
Amigos podem ser de qualquer cor, de qualquer lado. Que falem qualquer língua, que não falem nada. Podem ser consanguíneos ou que não tenham sangue nenhum.
Podem ser vivos ou mortos, só precisam ser amigos.

Amigos, como não tê-los? Impossível!

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Primavera

Floresça se for capaz! Força, coragem: margaridas, acácias.
Amadureça: violetas, begônias, de maio.
Regue-se, indulgencie, esqueça: rosas, lírios, edelvais.
Tranquilize-se, compreenda, adube, cresça. Eu não duvido um só momento, que seja possível e vou te incentivar até cansar.
E direi o tempo todo, “que vejo flores em você, que vejo flores em você”!


terça-feira, 23 de setembro de 2014

Um dia

Deixar para amanhã não se encaixa somente no princípio da postergação, que traz certo ar de preguiça, prontamente condenável em qualquer cidadão.
Infelizmente, participa, mais do que deveria, do contexto do sonho, do almejar, da deliciosa mágica de poder vir a ser, que é deixada para, “um dia”. Atitude esta, mais que condenável, sentencia qualquer cidadão ao tédio.
-“Serei piloto, um dia”.
-“Ainda vou voar de Asa Delta”.
-“Meu maior sonho é construir uma máquina que faz nevar”.
-“Sempre quis ser Miss Universo”.
O deixar para amanhã se intromete e vai amolengando o cidadão. O tudo de menos monta toma conta de seus dias esquálidos, sem viço, enquanto seu brilhante desejo se esvai acinzentado, num estranho túnel do futuro.
-“Não tenho jeito pra coisa”.
-“Agora, já estou velho”.
-“Não era uma boa ideia”.
-“Ah! Era um sonho bobo”.
E lá se vão os anos. Assim, um dia, se tudo não der certo, talvez, o sonho, o almejar, o mágico vir a ser, cansados de tanto esperar virão pegar o cidadão pelo colarinho e dirão:

“É agora ou nunca”!

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Isto não te traz paz?

 Venha flutuar no espaço sideral. Esteja por debaixo de um planeta. Uma esfera gigantesca se movendo, deslizando na imensidão, com ritmo e sonoridade musical. Continue aí e arrisque um olhar enviesado e maravilhe-se com os outros: Netuno, Plutão cadenciados e atraídos em uma enorme onda, cruzando o mar do céu.
Agora, olhe para você, uma pequeníssima partícula de poeira estelar. Um nada de alguma cidadezinha lá em baixo, bem lá em baixo. É fato, você não acreditará que a mesma Força Amorosa que move e atrai aqueles Titãs, sabe sobre você.
Vai te parecer inexequível que sobre tempo e espaço na lida da Força, para se preocupar com um interioranozinho lá de baixo, mergulhado em confusões e dores até a raiz dos cabelos.
Continue olhando aquela exuberância, eu sei que você não se vê e agora, treme de medo. Não se apavore ainda não.
 Sabe, há um adágio inexorável que diz que: tanto o macro quanto o micro são objeto de atenção da Força. Ela, de todo o sempre, entorna certo licor de amor, alimentando e inebriando qualquer criatura, acima nos céus e abaixo dele.

Isto não te traz paz?

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Deixe-os ir

Na fila, o caixa grita: - “O próximo”. Não é você, é o próximo.
- Mas que tipo de roupa é essa? Por que se remexe tanto? Esbarra em você. Será que é cego?
O próximo segue e bate com a bolsa em você, te acotovela. Descobre um amigo no fim da fila e grita:- Oi fulano. Conversam sem sair de seus lugares.
-Mas que tipo de conversa é essa?
E são muitos os tipos de próximos desfilando sob a crítica de teu olhar. - Não deveriam isso, não deveriam aquilo e a fila prossegue. No fundo, no fundo, você não quer continuar as avaliações, não quer ser juiz, não quer prendê-los.
O próximo insiste. Não se comporta bem. Erra no português. Reclama da fila, do caixa.
“O próximo”- grita o caixa, agora, é você. De costas para o resto da fila, exausto de críticas e de óticas, você se apruma pensando em se comportar bem. Para não ser julgado e metido em cadeia. “E de lá não sairás”.
Então você decide. O próximo é único, é belo, é livre. Jamais os prenderá a seus julgamentos, novamente. Sim, é melhor deixá-los ir.


quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Assinado por...

Cheguei bem. De alguma sorte, no início, tive sorte. Fui recebido na estação por quem esperado. Dispensaram-me gentilezas.
Passou-se algum tempo, mudando vez por outra, nem sempre recepcionado, nem sempre com gentilezas, quase nunca satisfeito, achei-me cheio de azares.
Encontros, desencontros, esquinas solitárias, curvas perigosas, becos escuros e ruas sem saída era como descreveria meu lugar.
Aprendendo a jogar, jogava o jogo para o meu lucro, para o meu bem. Afinal, não era para isso que tinha vindo? Tentar a sorte? A minha e a de ninguém mais.
A sorte me escapulia por entre os olhos e ouvidos. A frustração me agarrava pelas mãos e pelos pés. Atado, amordaçado passei horas e horas de pura lamentação e estertor.
A que terras me lancei? Que águas, almejei singrar? Quero voltar! Quero voltar! Passagem só de ida, entretanto, havia comprado acreditando em que se plantando tudo dá. Só me esqueci de plantar.

Então, desatei-me com um pouco de sorte e plantei com muito esforço. Hoje em dia, colho algumas flores de maio, sou um pouco herói. Não sei de tudo, mas o pouco que sei me deixa achado, recebido, acolhido e feliz. Assinado por Deus.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Entre, por favor!

Você reconhece o lugar? Depois de estar mil anos fora. De andar mil léguas, não, não!
Entre, por favor, a casa é sua. Está do jeitinho que você deixou. Nada, no mundo, é tão seu. Em nenhum outro lugar do mundo, você estará tão feliz. Aproveite, é início de temporada, sua estadia é grátis.
“Mil anos de solidão” não foi bastante? Aconchegue-se, aprecie os cômodos, não repare a bagunça. Tudo se ajeitará. Afinal, você está de volta e com olho de dono, a casa ficará arrumada.
Esteja à vontade, do que você não gostar... Faça como queira. Mas, mas tem muita coisa aprazível, você não acha?
Areje. Distraia-se. Abra todas as janelas. Regue as plantas. Beba, à tardinha, o que você quiser. Mude a posição dos móveis, em três palavras, sinta-se em casa.
Voltando a falar de solidão, não se preocupe, o lugar parece ermo, entretanto, esta não é solidão de verdade. Segundo Chico Buarque “solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela nossa alma”.
Portanto, entre, por favor, você estará bem acompanhado e cheio de si!!!


quinta-feira, 4 de setembro de 2014

BOA NOITE E BOA SORTE

Dispensados do dia, lá vão eles para, Deus sabe onde.
Dispensados do azar, ávidos por sorte, eles vão para além dos limites da imaginação. Libertos, de liberdade vigiada, encarceram-se em cômodos escuros. Uma sonoridade duvidosa os envolve e imersos em líquidos fugazes, se dissolvem em ninguém.
Sem endereços e cheios de adereços, jogam valendo uma moeda estranha, esperando por uma paga que não vem.
O tempo, sujeito a chuva e trovoadas, desmancha o brilho da noite imaginada. A mesma meteorologia é prevista no lado de dentro dos dispensados e opacos no íntimo saem dos cômodos de mãos vazias.
O dia retorna, eles retornam, então, engajados em Deus sabe o que.
Acreditam-se murchos e azarados, cambaleando sob o sol. Focados no movimento de rotação, dispensam a luz que há no dia e o engajamento os dispensa.

Então, quando a lua se compromete com o céu, mais uma vez, pedem a Deus uma boa noite e boa sorte!

terça-feira, 2 de setembro de 2014

A resposta é 42

Como se lida com a dor? Por que ela se repete?  E os desafios, não param? Onde está e o que é felicidade?
“A resposta é 42” (diz Douglas Adam). Ironia bem vinda ao caos da refrega eterna. Afinal, há que haver humor se não, nem com guaraná, desce a vida pela goela. Considerando então, que humor é remédio, vamos tomá-lo.
Se não sabes por que sofres, a resposta é 42. Se ficas frustrado pelo bem que não vem, a resposta é 42. Se tens e no momento seguinte  és mendigo, a resposta é 42.
Pensando bem, é uma boa resposta. Não são 100%, não é a metade, não é tão pouco como resposta nenhuma, zero. Como não se confia no 30, o 40 sai ileso e mais 2 por garantia, temos a resposta exata.
 Então, mesmo que não saibas nada sobre os desígnios divinos, está tudo certo. O plano continua perfeito, e na roda da sorte, em se soltando a bolinha, dá sempre 42.

Boa sorte!!!

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Que estejamos perplexos, mas não derrotados nem paralisados.

Quando as notícias correm, apressam-se em definir o itinerário da humanidade: morro abaixo, fundo do poço e última parada – apocalipse
De olhos faiscantes e língua solta comunicam céleres, os genocídios e todo um cesto de refugo vergonhoso do planeta. Sem censuras e sem pudores, lá se vão as notícias, desmanchando prazeres e esperanças
Em HD não se ajeitam com a discrição, e parece que é de malvadeza que se especializam em esmiuçar em close caption as rugas, espinhas e cicatrizes do mundo.
A humanidade assiste perplexa sua roupa suja lavada e levada aos quatro cantos pela globalização. Rendida e vendida por tão pouco, tão pavorosamente desnudada, nem mais se reconhece cria do “Criador”.
Mas há uma esperança antes da última parada. A humanidade e as notícias marcaram um duelo ao entardecer. Em digital e tudo, o planeta vai poder assistir.A primeira vai sacar de todo gesto venturoso, valentia humanitária e sensatez. De maquiagem pesada para não causar má impressão.
A segunda, bem, a segunda já não mais tão mordaz, vai usar da velha covardia e de asneiras.Mas, ao entardecer, ela terá um adversário à altura, uma humanidade não mais perplexa nem paralisada e que, certamente, vai atirar primeiro.

terça-feira, 26 de agosto de 2014

Manda pra mim!

Na exclusão da lista, o item renegado era o mais importante. Descartado na lixeira, ele, simplesmente, aquiesceu. Fora relegado e pronto. “C’est la vie”.
A noite chegou, o item não se moveu. No entanto, ela se moveu. Cruzou o corredor quase sem folego. Entrou na sala, pegou a lixeira e sentou-se com a preciosidade nas mãos. Respirou fundo e começou o resgate. Pinçava cada folha amassada com as pontas dos dedos, cuidadosamente, para não desintegrá-la.
O item sorriu. Tranquilo esperou sua vez e ela chegou. Ela o desamassou com carinho, suspirou profundamente e o encostou ao peito. Chorou e chorou. Levantou-se, estendeu-o  e o alisou com ternura.
O item remexeu-se cheio de prazer. Afinal, fora enviado, tinha um destinatário. Ela olhou em volta e constatando a solidão, aproximou a folha de papel do espelho. O item refletiu-se entusiasmado. Ela leu em voz alta: “Amor”!!


quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Beijinhos e carinhos sem ter fim

Como se achegar ao outro se o outro atravessa a via expressa, evitando o encontro.
De que forma apertar as mãos se as outras mãos estão de punhos fechados.
Por que caminhos trilhar até o lar vizinho se todas as grades sonegam um cumprimento.
Como pedir um abraço se os braços estão algemados pelas costas e encurvado, o outro amedrontado diz “não”.
Por que tréguas conseguir que as guerras façam as pazes com a paz se a guerra é amiga do medo e inimiga da fraternidade do afeto.
Como conseguir ser solidário e deixar de ser solitário se o “dente por dente” é a lei do mercado.
Por quais ares poder-se-ia ser alado e ver, bem do alto, toda harmonia do mapa da agonia. Enxergando assim, a estatística minguada do mal e do fel e as grandes áreas do leite e de mel.
Quando, um pedido de abraço encontrar o ser alado que viu a Terra por cima, por certo será atendido. O medo, minguado, dará lugar ao que no mapa corresponde a grande área de estima.
Por isso não desisto.
Pode me dar um abraço?!!!


terça-feira, 19 de agosto de 2014

O troféu

Hoje é dia de festa, é dia de comemoração. Comemoramos nossa vitória e levantaremos nosso troféu, o trem.
Comemoramos o retorno da chama de estarmos comprometidos com os presos no vão das plataformas ferroviárias.
De estar compromissados, a tempo e a hora, com a grande família universal, em wi-fi, que se conecta em qualquer lugar onde houver rede e necessidade.
E mesmo que não sejamos super-homens, elevamos do chão, o mais pesado, no ar.

E a plenos pulmões mostramos aos nossos corações que: “Eu posso amar”.

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Ziguezague e pow! (Sexta-feira negra, depois passa)

É inútil me fazer ver a vida por um prisma melhor. E dizer que – “pode apostar”. Hoje é noite, daquelas que dura, não há dia. Nada daquele axioma de que não existe noite e o fato é que a Terra dá a outra face para o sol. É esta mesma a questão, dar a outra face, parece que ninguém quer. É tanto “olho por olho”.
Não vai adiantar fazer crer que quem faz a beleza são os olhos de quem vê. Nem esperar que o melhor esteja por aí, porque eu não vou achar, nem procurar.
Não surtirá efeito, Beatles, nem Vivaldi, nem champanhe. Nada desce, a garganta deu um nó.
“Falar com Deus”? Nem pensar. Afrouxar, relaxar e ziguezaguear, não, não e não!!!
É noite, para sempre e só.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

O corpo

O corpo amortalhado e sereno. Muitas vozes, muitas vozes ressoavam no recinto, não as dele, do corpo, mas de outros corpos com bocas e ouvidos atuantes.
Muitas opiniões, muitos rótulos, muitas ideias sobre ele, o corpo, amortalhado, mas, não mais sereno.
Ouviu tudo! Não sabia como, mas, ouviu e permaneceu quieto e imóvel. Muitos corpos debruçavam sobre ele, o corpo não mais sereno. Muito choro, lamentações e ele, o corpo permaneceu imóvel. De tantos e tantos corpos aglomerando-lhe em volta, cansou-se, abstraiu-se e retirou-se das críticas e dos planos.
Permanecia deitado imóvel, mas leve, muito leve, agora. Na verdade, o corpo flutuava, e as vozes iam ficando longe e mudas e emudeceram de vez. Entretanto, um novo som chegava delineando-se, uma música, sim, uma música só instrumental, Let it Be. Não sentia incomodo algum, nem medo, nem raiva, deixou-se, então, flutuar bem acima daquela caixa, daqueles corpos. Enrijeceu-se de súbito, mas não parava de subir, então desejou voltar, descer para o aconchego das críticas, dos planos, dos rótulos, de tudo. Pairou, outra vez, em silêncio no recinto.
Agora era ele que se debruçava sobre os outros corpos com bocas atuantes. Debruçou-se de pilhéria, sem que risse, nem com a boca nem por dentro. Colava-se, imiscuía-se  entre dois corpos outros, só não mais se aproximou da caixa.
Num dado momento, ainda sob o influxo de Let it Be, definitivamente, o corpo abstraiu-se do recinto, da caixa, dos outros corpos, e ninguém, ninguém soube para onde.



quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Brand new

Everything, with the passage of time, becomes new, not old.
Stars, the moon, days resemble rotine, but are really, fresh new. There’s novelty all the time in minutes, in seconds, in time.
Feelings seem to be tired, ancient, but sparkle from a new angle when they’re closed observed.
People, frequently, introduce themselves with the same name, seem to be old friends, but rather, they’re others, they’re new.
Coming and going to the job, steps, behavior, and deeds are repeated again and again, but only on the surface, it’s new, deep inside. Everything with the passage of time is always, brand new.
Nevertheless, it’s need not to be tired or hopeless. It’s need not to rock the boat. Not to cry over the spilt milk. Go shopping, picking up inside each person, each response, each time of year, each check in.
Purchase, look into, and stare at. It’ll be very ease, you’ll find, to see a new glow, a new adornment and a new response.
And do not give me that: “not teach an old dog new trick”.





Tudo novo de novo

Parece rotina os dias, as estrelas, a lua, mas é tudo novo.
Tem novidade o tempo todo, nos minutos, nos segundos, nos tempos.
Os sentimentos parecem cansados, antigos, mas brilham num novo ângulo, basta inspecionar.
As pessoas se apresentam como as mesmas, ledo engano, a cada segundo, são outras, são novas.
Indo e vindo do trabalho, os passos, o jeito, o feito parece repetido e repetido, mas é só na textura, no amago é novo.
É sempre tudo novo de novo, é preciso não cansar. Não entregar os pontos. Não entornar o caldo. Não chorar sobre o leite derramado.
Vá às compras, olhe as vitrines de cada gente, de cada emoção, de cada estação, de cada estadia. Pechinche, averigue, perscrute. Vai ser fácil, você verá, achar um novo brilho, um novo adereço, um novo apreço.

E não me venha com essa: “Não se ensina truques novos a cachorro velho”.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Thor

Ele estava sentado em uma das cadeiras do Banco, daquelas em que se esperava ver um idoso. Era um menino de uns doze anos, tipo nórdico. Alto, magro, cabelos castanho claro liso. Não muito compridos, não lhe emolduravam o rosto, não, várias pontas, mas encobriam a testa e as orelhas.
Estava sentado olhando para a televisão, quase como se não estivesse ali. Plácido, sua presença era leve. A maquininha da senha continuava chamando mais um, naquele tom de meia nota musical.
O burburinho das vozes queixosas se misturava ao som das senhas, quando a mãe do menino aparece. Com ela vem outro menino pequenino de uns seis anos, de óculos e um aparelho de surdez nas orelhinhas. A mãe diz para o menino de doze anos: Thor! Toma conta dele, chegou a minha vez.
Thor levanta, suavemente, e vai ao encontro do irmãozinho.                                            
A vida tem dessas coisas, tudo parece tão feio, triste e insano, principalmente nos Bancos. Tanta gente ávida para pegar seu quinhão, tornando-se tão intolerante e agressiva. Reclamam da demora, dos caixas, do Banco, da gerência e de tudo. No fundo, são pessoas carentes de algo imaterial que as proteja.
 Então, vez por outra, um Deus ou um super-herói aparece para salvá-las. “Thor! Toma conta dele”. E Thor, em pessoa, toma conta de seu irmãozinho e dos outros seus irmãos da Terra.


quinta-feira, 31 de julho de 2014

PROTESTO

O prefeito mandou arrumar a bagunça do protesto. Com esta desorganização não dá.  Vai ter dia certo, horário e lugar pra protestar. Mas, já avisou, também, que Deus o livre de censurar o que você vai dizer, isto é lá, exclusivamente, com você. Ficou, então, uma dúvida: se está tudo tão certinho por que você vai protestar?
“Durma-se com um barulho deste!” Não dá! Mas, vá arrumando um manifesto, palavras de ordem, coisas a cobrar, pois, de ordem o inferno está cheio e o Município não está.
Entretanto, se você medrar e resolver renunciar ao seu gesto, ao seu protesto, não se sinta um João ninguém, vá lá, no horário certo, no lugar e dia certo e cante parabéns, é a ironia que dá.
Não se dê por vencido e creia que “há muito mais entre o céu e a terra do que supõe sua vã filosofia”. O que o prefeito está fazendo é pura picardia, mas, se ele admite o direito de protestar, já é um bom sinal de mudança e mudança é tudo o que o céu quer.


Então, agora, já que está tudo certo de que se pode mudar, mude você também e não proteste mais lá. Proteste dentro de si, onde a verdade está e conhecendo a verdade esta te libertará. 

terça-feira, 29 de julho de 2014

Um gárgula

Fico pensando se só eu tenho um gárgula em casa. Se essa figura detestável, que assombra os filmes, os beiras dos castelos, habita só no meu lar. E concluo decidido que não. Um gárgula para cada lar é ipso facto.
Se o dia amanhece bonito, ele desloca-se irritado e sai voejando com suas asas desajeitadas e seu aspecto lúgubre de poucos amigos. Se o dia está nublado ele concorda e se posiciona no meio de algum cômodo, sentado e em paz com cara de dono da situação.
De ordinário, salta pra lá e pra cá, impondo sua cara feia em meio a qualquer vislumbre de nossa alegria. Impede a passagem quando decidimos alguma coisa nova com suas asas escuras.
Como classificá-lo para exterminá-lo? É um inseto, um animal, uma escultura, o elo entre o anjo e o demônio ou uma miragem? Que espécie nova de spray daria cabo dessa fera?
Sabe, sob o costume de seu manquejar, mancamos também, desalentados vez em vez e quase sempre. Sob o impulso de suas asas tolas nossos voos são débeis tentativas de sair do solo, ao qual voltamos sempre, com certo estrondo.
Que espécie de dedetização acabaria com essa peste? Não sei, quanto mais penso, tenho que encarar o fato de que ter um gárgula em casa, já é uma epidemia. O governo deveria tomar alguma medida na área da vigilância sanitária, uma vacina, talvez.
Mas quedo em desânimo, pois o governo está sempre escondendo os índices de epidemia, e a ciência inventa sempre um composto que resolve uma coisa e estraga a atmosfera. Portanto, o jeito mesmo é usar a vassoura.
De vassoura na mão me movo na tentativa de espantar a criatura, que vai mudando de lugar a cada vassourada. Qualquer dia desses, ele se desloca para a porta e num último cutucar... Quem sabe?!!!




sexta-feira, 25 de julho de 2014

O único mal irremediável

E se aprontaram para o Auto.
Jesus estava lá, e lá estava, também, “aquele que não se pode pronunciar o nome”. Chegaram os contadores de histórias. “Aquele que não se pode pronunciar o nome” ajeitou-se, empertigou-se como se a pensar: “hoje é meu dia de sorte”. Acreditava ele que contar histórias era o mesmo que mentir, e como quem mente vai para o inferno... Esfregava as mãos de puro contentamento.
Jesus que conhecia a verdade estava impávido, tranquilo e infalível. Os contadores de história tinham causa ganha, bem o sabia, não precisaria lançar mão de sua santa mãezinha.
Ariano, o contador de histórias de Autos, estava lá, também. Havia se encontrado com “o único mal irremediável que une tudo que é vivo no mesmo rebanho de condenados”. Via se repetir, em frente a seus olhos, a mesma história que um dia contara e pensava consigo que não daria gosto ao “coisa ruim”, nem convocaria a Santa, como conciliadora. É bem verdade, que estava um tanto perplexo diante de sua criatura. Intimamente, ansiou por João Grilo que saberia como lidar com aquela situação. Até mesmo, desejou ter a mesma sorte do “amarelo safado”. Suou frio, um pouco, não falou quase nada, mas ouviu muito de uma história bem parecida com a que havia criado. Cabeça baixa, coração aos pulos que “quase iam pros pés”, aguardava ansioso a sentença final. No final, tudo deu certo. Ficou sabendo que faria parceria com Grilo na Terra e que ia poder viver mais “umas cem vezes”, como disse desejar em uma entrevista.
Jesus se deu por satisfeito. O “outro” por furioso ao saber que um contador de histórias, inventor de Autos não são mentirosos não. São aliviadores de dores, acalentadores de corações. Merecem o céu, a vida, e nunca irão para o inferno.




quinta-feira, 24 de julho de 2014

VIU? VALEU A PENA ESPERAR!

A Espera disse pro Tempo com Pressa, que com pressa não poderia ajudar.
O Tempo ligou para a Ânsia e disse que o combinado desfez-se.
A Ânsia zangou-se e mandou recado para o Homem dizendo que era para ele se virar. O Homem virou-se e resolveu se danar. Correu para tudo resolver. Fez escolhas até não aguentar mais. Tomou medidas, precauções e ações, aos borbotões.
Fechou a cara cerrou os punhos e decidiu na sua vida mandar. Danou-se, esfalfou-se, para que o desejo, cada vez, mais ardente, não precisasse esperar. Desejou tudo que pode e projetou para realizar.
A Ânsia pediu um tempo. O Tempo pediu ao Homem para esperar. A Espera continuou a se fazer de rogada e sem prazo, sem nada, continuou a postergar.
O Homem percebeu a má vontade e deixou para lá. Aquietou-se, reviu o desejo, revisou seus poderes e fez a ação estancar. Consultou o Plano Cartesiano, marcando encontro para novas coordenadas traçar.  Aliou-se à Paciência e à Calma e no dia marcado para o encontro, estavam lá.
O Homem encontrou o que queria, recebeu o que merecia, viu? Valeu a pena esperar.




terça-feira, 22 de julho de 2014

Procura-se o médico


       É a sala de espera do ambulatório. Nesse momento, ela abriga vítimas das doenças, com seus olhares lânguidos e sorrisos parados que desistiram a meio do caminho. Lá, estão eles. Lá está ele, Dr. Jackiel, se esgueirando no corredor, rumo à sala do ambulatório. De cenho fechado, caminha cabisbaixo, não quer ser visto, não quer se comprometer. Dizer “Bom dia”, “Olá”. 
       É a sala do ambulatório. Nesse momento, ela abriga o médico, soturno, ensimesmado. Não está doente da mesma doença daquelas vítimas, lá na sala de espera, mas, é, sim, um paciente de outros males. Hoje, especialmente, está muito mal, e piorou quando viu todas aquelas fichas esparramadas sobre a sua mesa.
       Abriu, devagar, a porta da sala de espera e olhou com tontura, pela fresta, para o grupo amolentado. Sentiu raiva, sempre sentia raiva de estar ali, de ver todos aqueles doentes e de não ver as doenças. Todos os dias esgrimava com essa ideia. As doenças se incubavam, se escondiam, habitavam, secretamente, o doente. Não podiam ser sacudidas, desmascaradas, postas para correr. Isto, sim, ele saberia fazer. Padecia do mal da ira. E ficava, constantemente, irado, apresentado que era cinco dias na semana, àquelas criaturas entregues, passivas que não podiam ser sacudidas nem desmascaradas. Tinham que ser atendidas, ouvidas e amparadas.
       Não era para ele essa lida. Afinal, ele, também, estava doente. Não era atendido nem entendido. Ninguém procurara dentro dele com exames e raios x o mal da cólera com a vida. Não, ninguém havia tentado desmascarar o Mr. Hyde que se entrincheirava dentro de seu peito. Ele, sim, precisava de um médico. 
      Pegou seus pertences e saiu pela porta dos fundos da sala do ambulatório.