terça-feira, 22 de julho de 2014

Procura-se o médico


       É a sala de espera do ambulatório. Nesse momento, ela abriga vítimas das doenças, com seus olhares lânguidos e sorrisos parados que desistiram a meio do caminho. Lá, estão eles. Lá está ele, Dr. Jackiel, se esgueirando no corredor, rumo à sala do ambulatório. De cenho fechado, caminha cabisbaixo, não quer ser visto, não quer se comprometer. Dizer “Bom dia”, “Olá”. 
       É a sala do ambulatório. Nesse momento, ela abriga o médico, soturno, ensimesmado. Não está doente da mesma doença daquelas vítimas, lá na sala de espera, mas, é, sim, um paciente de outros males. Hoje, especialmente, está muito mal, e piorou quando viu todas aquelas fichas esparramadas sobre a sua mesa.
       Abriu, devagar, a porta da sala de espera e olhou com tontura, pela fresta, para o grupo amolentado. Sentiu raiva, sempre sentia raiva de estar ali, de ver todos aqueles doentes e de não ver as doenças. Todos os dias esgrimava com essa ideia. As doenças se incubavam, se escondiam, habitavam, secretamente, o doente. Não podiam ser sacudidas, desmascaradas, postas para correr. Isto, sim, ele saberia fazer. Padecia do mal da ira. E ficava, constantemente, irado, apresentado que era cinco dias na semana, àquelas criaturas entregues, passivas que não podiam ser sacudidas nem desmascaradas. Tinham que ser atendidas, ouvidas e amparadas.
       Não era para ele essa lida. Afinal, ele, também, estava doente. Não era atendido nem entendido. Ninguém procurara dentro dele com exames e raios x o mal da cólera com a vida. Não, ninguém havia tentado desmascarar o Mr. Hyde que se entrincheirava dentro de seu peito. Ele, sim, precisava de um médico. 
      Pegou seus pertences e saiu pela porta dos fundos da sala do ambulatório.

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