terça-feira, 28 de abril de 2015

Quem diria? Quem faria?

O labirinto de “dizer e fazer” é muito mais ameaçador do que aquele em que te aguarda o Minotauro, sabia?
Entre dizer e fazer há um labirinto sem mitologia ou magia, onde você aguarda você.

O que te parece tão certo, tão fácil sair da boca, na hora, na hora, sai como nada, soa como abismo e nunca é o que você queria dizer.

Diga que diga, fala que fala - “quero ver fazer”.
A palavra, mesmo que não acertada tem valentia, mas a ação, coitada, para encurralada.

No labirinto, no canto, o dito e o feito, em pânico, aguardam você.
Você diz que diz, faz que faz e se põe a tremer.

O caso agora, só tem uma solução: é dizer e fazer, ou, então o Minotauro pega você.



terça-feira, 21 de abril de 2015

Memórias

Sujeito a chuvas e trovoadas, assim estava seu coração. Um aguaceiro já inundava lhe o colo, enquanto ela se afogava em palavras.
Palavras não ditas,palavras mal ditas,repassadas por entre os olhos. Repetidas, visíveis e doloridas, tudo ao mesmo tempo.
Quisera não existir, e a memória, também. Quisera ser salva por tudo de bom que estivesse no porão. Que a meteorologia fosse insciente e memórias fossem feitas de boa fé.
Entretanto, estava ali, nadando contra a correnteza e sendo engolida por uma baleia azul.
De nada adiantava ter vencido os trezentos metros rasos, ter um eco cardiograma invejável, nem ser bilíngue, era o fim.
Lembrou-se, então, que uma imagem vale mais que mil palavras. Projetou um lindo céu azul, um bote salva-vidas, seu artista favorito, uma maça, e começou a reescrever suas memórias.


quinta-feira, 16 de abril de 2015

Um conto de quem me dera

Quando Scrooger recebeu a visita dos fantasmas do Natal, a plateia emudeceu e cismou se deveria, ela também, perscrutar seu íntimo.
Ela, também, deveria refrescar-se de ares tão asfixiantes e transformar-se?
Quem me dera, a plateia pudesse sair da ficção não mais avarenta, sem seu jeito de gárgula defensor de um território sombrio e em ruínas.
Sorte, sorte, sorte seria se o Scrooger de dentro dela fosse entregar presentes para o pequeno Tim. Se cada espectador de olhos arregalados se lembrasse dos pequenos Tim, que moravam nas cercanias de seu coração.
Quem me dera ter minha cidade exalando Natal, sempre. Scroogers e gárgulas varridos para local desconhecido.

Quem me dera ter todo habitante, olhos e ouvidos prontos para receber, sem fantasmas, um bom Natal, no presente.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Onde estão as flores

“O velho sortudo sol não tem nada pra fazer, a não ser vadiar pelo céu, o dia inteiro” dizia Ray Charles. Ele falava a verdade. Fica claro como o dia que, enquanto o astro rei vadia, nós, os mortais dependentes de sua luz, sob a vergasta de muito calor e dor, rolamos pela Terra em busca do pão.
Sabendo ser lá do Céu, onde ele está que vem toda justiça, perguntamos: - “Por que lá está ele gozando e cá estamos nós, filhos da mesma causa, amargando”?
Por entre muitos enganos tentamos por todos os meios gozar, mas, a verdade é que somos gozados. Pelo velho sortudo sol e pelas bandas onde ele está, o céu.
Não deveríamos ser tão insolentes, mas não podemos ignorar que sim; temos o trigo, com muito suor, o joio com facilidade e então preguntamos: “E as flores, onde estão as flores”?




quinta-feira, 9 de abril de 2015

Surpresa!!!

E pensou-se isso e aquilo de alguém, num momento, e no outro, aí está, surpresa, não era nada daquilo. O alguém não estava fazendo aquilo, pensando aquilo e não sendo aquilo.
Pressupor, julgar sempre foi pecado, já era tempo, de não se querer ir para o inferno.
Aliás, não há mais tempo para desejos ou decisões, já se vive nele, por tantas pressuposições, preconceitos e julgamentos. O peito arde em chamas de medo, de angústia e de raiva daquele sobre quem se pensou isso e aquilo.
Não há quem nos tire de lá. Pensando bem, de vez em quando, a verdade passa revelando que fulano é sempre o reflexo de cicrano. Farinha do mesmo saco, membro da mesma trupe tentando comer o mesmo pão e não aquele que o diabo amassou.
Assim sendo, julgar isso e aquilo de alguém, que, simplesmente que ser feliz e “respirar ar pelo nariz” é falta do que fazer.
No final, é tudo gente e o interior de toda gente, dizem por aí: é uma caixinha de surpresa.





terça-feira, 7 de abril de 2015

Presente de Grego

Se te roubarem a noiva, não aceites nenhum presente. Se aceitares um presente, não roubes a noiva de ninguém. Se te cansares de roubar, dar e receber presentes – não és mais grego, nem troiano. Que bom!
Agora, talvez, sejas alguém diferente. Cansado da velha trilha, da velha guerra. Podes até, recomeçar. Recomece do zero, fora de Roma. Evite Paris e Londres. Não feches o cenho, estejas à solta. Sem identidade pregressa, já não podes ser preso, exilado ou solto.
Não vás despencar de onde já caíste. Não mates, não morras.
Pensando bem, deves estar se perguntando; se já não pertences a nenhum clã, se já não tens documentos, se já passaste bem longe das terras prometidas, por que aceitar tantos imperativos de mim?

Verdade seja dita, às favas com os impérios, às favas com os rancores. Libertas Quae Sera Tamen. Afinal, não és mais, nem grego, nem troiano.     

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Por toda eternidade

Todos entendem um pouco de eternidade, afinal, qualquer um deseja não passar desta pra melhor e nunca visitar as instalações da cidade dos pés juntos. O problema está em aquilatar e lidar com as dimensões de “eternidade”.
“Viver por toda eternidade” soa mal, mesmo que seja um sonho não morrer. Acontece certo fastio dentro de qualquer mortal ao pensar em minutos, segundos e horas, tudo elevado a n.
Mesmo porque, parece ir muito mal, nossa vida de cada dia, nesta finíssima fresta do tempo que é hoje. Todos querem viver muito, ter muito de tudo, mas desistem de qualquer coisa que custe muito ou que leve tempo para acontecer.
A eternidade não cai bem, no mundo do imediato. O que todos querem – felicidade, prazer e arte, querem pra agora e mesmo que esperem que dure pra sempre, já se desgostam no clique do mouse. Há um jogo de gato e rato nisto tudo. Todos fugindo da morte e perseguindo a vida, a morte perseguindo a todos e todos fugindo da vida.
E fica assim: a felicidade que ansiávamos, o gato comeu, a eternidade que nos espera nos desespera, e a vida, a nossa vida aqui e agora, escorre pelo ralo.
Então, todos decidimos: -“Deus nos livre de ser eternos”.
Que a vida seja agora, que a felicidade sendo pouca possa ser justa e que a morte sendo certa possa atrasar-se bastante!!!