quinta-feira, 19 de março de 2015

A porta

Era de cedro, novinha. Não rangia, não batia nem emperrava. Brilhava. A maçaneta de cobre a toda mão se adaptava.
Abria, o homem saia e ia se embriagar. Fechava, depois que o filho entrava doido pra descansar.
Abria, a empregada saia e ia se libertar. Fechava, depois que o neto chegava e ia a casa alegrar.
Abria, a avó saia e ia presentes comprar. Fechava, depois que a filha entrava e ia pro quarto chorar.
Abria, todos os amigos entravam, para lá dentro, festejar. Fechava, depois que todos chegaram para a alegria ficar.
Um dia, abrira e ficara escancarada, sem mais abrir e fechar. Abrira e todos saíram, um, para nunca mais voltar. Ficou todo dia entreaberta e à noite, veio a fechar, depois que todos entraram, para manter a tristeza lá. No dia seguinte, sem mais abrir e fechar, não via o sol nem a lua e esperou vários dias, pra voltar a trabalhar.
Abandonou a alegria e passou a desenvernizar, a maçaneta enferrujou, desistindo de brilhar. Mas, depois de algum tempo, um homem esteve por lá, fez ajustes fez acertos e a porta voltou ao velho ofício.
 O sol deu uma espiada, a lua ficou contente, e a porta, a porta resplandecente, continuou reverente à sua missão de fazer sair e entrar toda gente.
(Humilde homenagem-lembrança ao “poetinha”, Vinícius de Moraes).                   



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