O corpo amortalhado e sereno. Muitas vozes, muitas vozes
ressoavam no recinto, não as dele, do corpo, mas de outros corpos com bocas e
ouvidos atuantes.
Muitas opiniões, muitos rótulos, muitas ideias sobre ele, o
corpo, amortalhado, mas, não mais sereno.
Ouviu tudo! Não sabia como, mas, ouviu e permaneceu quieto e
imóvel. Muitos corpos debruçavam sobre ele, o corpo não mais sereno. Muito
choro, lamentações e ele, o corpo permaneceu imóvel. De tantos e tantos corpos
aglomerando-lhe em volta, cansou-se, abstraiu-se e retirou-se das críticas e
dos planos.
Permanecia deitado imóvel, mas leve, muito leve, agora. Na
verdade, o corpo flutuava, e as vozes iam ficando longe e mudas e emudeceram de
vez. Entretanto, um novo som chegava delineando-se, uma música, sim, uma música
só instrumental, Let it Be. Não sentia incomodo algum, nem medo, nem raiva,
deixou-se, então, flutuar bem acima daquela caixa, daqueles corpos.
Enrijeceu-se de súbito, mas não parava de subir, então desejou voltar, descer
para o aconchego das críticas, dos planos, dos rótulos, de tudo. Pairou, outra
vez, em silêncio no recinto.
Agora era ele que se debruçava sobre os outros corpos com
bocas atuantes. Debruçou-se de pilhéria, sem que risse, nem com a boca nem por
dentro. Colava-se, imiscuía-se entre
dois corpos outros, só não mais se aproximou da caixa.
Num dado momento, ainda sob o influxo de Let it Be,
definitivamente, o corpo abstraiu-se do recinto, da caixa, dos outros corpos, e
ninguém, ninguém soube para onde.
Nenhum comentário:
Postar um comentário